terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Crimes sobre duas rodas

Autor: Maj. PM Valter Menezes

Em 2007, realizei a pesquisa Crimes praticados por criminosos conduzindo motocicletas. O trabalho reúne recortes de matérias publicadas, exemplos do cotidiano policial e relatos de ações promovidas em outros estados e até fora do país. A repercussão foi positiva e atingimos o objetivo de alertar os interessados sobre este assunto. Ações legais operacionais e administrativas, que poderiam ser tomadas pelo conjunto de órgãos envolvidos, infelizmente não foram tomadas naquela época, e olha que esperava ansiosamente que algo acontecesse. Por conta disso, os crimes continuam aumentando.

Esses crimes têm crescido de forma assustadora no Brasil, pois os criminosos descobriram que têm mobilidade e rapidez com as suas motos durante a fuga. Já sabem que, onde eles passam, as viaturas de quatro rodas não vão, não têm acesso e, quando desembarcam das viaturas para fazer a perseguição, os policiais não conseguem alcançá-los. Além disso, o capacete esconde a face do criminoso, que também costuma se ocultar sob máscaras.

O policial a pé não acompanha a velocidade de uma moto. Depois de consumado o crime, os infratores descem escadarias, passam em passarelas, sobem em passeios públicos, pontes, becos, cruzam canteiros de avenidas, passam por caminhos apertados e saem em outras ruas ou becos. Os bandidos têm também total mobilidade nos engarrafamentos das cidades, o que é mais um ponto a favor da realização dos delitos e à sua fuga vitoriosa. Eles escondem as motos dentro de casas, atrás de outros carros, cobrem com lonas, jogam no mato. É muito fácil esconder esse tipo de veículo.

A placa de identificação da moto (que só tem uma, o que considero um grande erro dos órgãos de trânsito) é tapada com um pano, uma cueca de criança, folhas verdes ou secas, com adesivo; com a mão de quem está de carona, é dobrada ao meio, pintada com pasta de sapato preto, alterando suas letras e números e com pasta de dente pode-se fazer também essa camuflagem. Já foram registrados casos em que as motos eram usadas em serviços de entrega, durante o dia, para a prática de crimes, à noite.

A famosa "saidinha bancária", que é um roubo violento, onde o meliante identifica seu alvo dentro do banco, depois faz o assalto e foge em uma moto, na maioria das vezes, tem se tornado um delito frequente nas cidades. Também identificamos muitos homicídios. Vou citar alguns só para se ter uma ideia: "Office-boy de concessionária (Americar Veículos) morre ao reagir a assalto - Abordado por dois ladrões dentro da Jerônimo Rocha tentou evitar assalto e acabou fuzilado (Correio da Bahia – 20/11/2007)". "Motociclistas matam professor de capoeira – Dois motociclistas mataram a tiros o professor de capoeira Everaldino dos Santos Sacramento, 30 anos, e feriram o amigo… Correio da Bahia – 09/02/08)". "Jovem é assassinado por motoqueiros – A tranquilidade do domingo foi quebrada, ontem pela manhã, na Avenida Hilda, Pernambués, depois que dois homens numa moto assassinaram a tiros Eduardo Leandro, de 21 anos (Jornal A Tarde 18/10/2004)". "Motoqueiro ataca viatura e fere policial no pescoço – O policial civil de 35 anos, foi baleado no pescoço por um motoqueiro, na Avenida Bonocô, quando dirigia uma viatura da Delegacia de Proteção ao Turista (Deltur)… (Jornal Correio da Bahia – 19/09/2006)". Tenho mais de uma centena dessas histórias trágicas guardadas, pois existem pessoas que leram meu artigo e continuam me mandando relatos de casos semelhantes registrados em outras cidades do país.

Essas ações delituosas ocorrem tanto nas cidades, quanto nas estradas ou zona rural, por isso o combate tem que ser integrado. É responsabilidade de todas as instituições policiais e órgãos de trânsito – nas esferas municipal, estadual e federal – trabalhar em conjunto para diminuir essa onda criminal. Já registramos grupos de bandidos saindo de cidades da região metropolitana de Salvador para agir na capital.

Rapidez, mobilidade e anonimato


Os criminosos já descobriram os três aspectos que ajudam nas suas ações: a rapidez na fuga, a mobilidade no deslocamento e o anonimato, seja através da placa coberta ou do uso do capacete. Os alvos dos meliantes são pessoas selecionadas, pois, devido aos três fatores que acabamos de citar, eles se mostram confiantes no êxito das ações criminosas. Eles não vão para os pequenos furtos ou roubos de coisas de baixo valor; por isso a "saidinha bancária" é um apelo forte, porquanto, em uma só ação, é possível levantar uma grande soma de quem acaba de sacar dinheiro num banco.

Em fevereiro de 2007, seis marginais, em três motos, roubaram um malote contendo dinheiro que ia ser depositado no Banco Bradesco, da Avenida Barão de Cotegipe, aqui em Salvador. No assalto, um PM foi baleado e uma senhora também ficou ferida. Os três meliantes-motoqueiros fugiram em direção ao bairro da Liberdade.

Estas ações são cometidas por marginais experientes, com prática em roubos ou homicídios. Atuam sempre em dois, normalmente o carona é quem atira contra a vítima, quem puxa o objeto de valor, quem puxa a bolsa ou maleta com dinheiro do cliente recém-saído da agência bancária. O carona é o marginal que aponta a arma em direção ao rosto do dono do carro e o manda descer ou sair do carro-alvo, para levar o veículo ou outra moto. É ele também quem cobre com a mão a placa da moto, muitas vezes regular, na hora de fugir ou ao passar nos semáforos.

Movido pela preocupação com o assunto, apresentei, à época da pesquisa, algumas sugestões, que republico aqui na esperança de que sejam aproveitadas: intensificar em todo o estado as operações-comando – blitz – de forma integrada (PMBA, PC, PF, PRF, órgãos municipais de trânsito, Detran etc) de forma que os motociclistas-criminosos sejam reprimidos, de maneira uniforme e dentro da lei, pelo poder público; propor a edição de norma no sentido de tornar obrigatório o uso de mais uma placa de identificação na motocicleta; tornar obrigatório o porte do documento original do certificado de registro de veículo (CRV), devidamente assinado e datado, para veículos de duas rodas recém-comprados; colocar em alto relevo no tanque da motocicleta a placa de identificação com números e letras.

E mais: pesquisar soluções adotadas por outros estados-membros da Federação e outros países para arrefecimento dessa modalidade de crime; mapear a evolução dessas práticas, de forma técnica, por todos os órgãos envolvidos, considerando que não há estudo específico de tal problema; envolver os sindicatos e demais empresas congêneres no processo de discussão em busca de soluções a curto, médio e longo prazo; pintar no capacete as letras e números da placa de identificação; intensificar a fiscalização em oficinas e sucatas de veículos, para evitar o desmanche de motos roubadas ou furtadas; realizar reuniões bimensais com os órgãos envolvidos, para avaliar a evolução das ações e se estão surtindo ou não efeito as medidas tomadas; centralizar as informações das ações delituosas realizadas por motociclistas-marginais em um único órgão público.


Autor: Major PM Valter Souza Menezes. Comandante da Rondesp/Atlântico e bacharel em Direito.


*Os artigos publicados na Coluna "A Voz do PM" não refletem o posicionamento oficial da Polícia Militar da Bahia nos assuntos em questão. Se você for policial militar e desejar publicar seu texto nesta coluna, mande seu texto com nome, posto ou graduação, OPM e currículo resumido para dmt.midiasocial@pm.ba.gov.br

2 comentários:

  1. Sempre percebi o grau de periculosidade que apresenta um criminoso utilizando uma moto como veículo de fuga. Diante da facilidade e eficiência que uma moto oferece ao criminoso para se evadir do local da prática do ilícito, com todas as artes manhas desenvolvidas por esses criminosos, com o passar do tempo, se torna cada vez mais difícil a captura desses meliantes. Quem nunca ficou apreensivo no trânsito no momento em que um motoqueiro pára ao lado do seu carro em um semáforo ?
    A situação é alarmante. Acredito que o Esquadrão Águia está atento a essa problemática e que medidas de cunho judiciário sejam tomadas a fim de neutralizar essas ações. Deve-se salientar, também, que as ações policiais na prevenção de práticas ilícitas por parte de motoqueiros sejam cautelosas e despidas de todo ou qualquer tipo de preconceito, já que existem uma diversidade de trabalhadores que utilizam uma moto para fins honestos e legais.

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  2. Senhor comandante,

    Lendo esse tópico aqui postado pelo senhor, começo a entender a PMBA, a realidade da visão da gestão , quando falamos em segurança pública. É louvável a iniciativa de se fazer uma pesquisa sobre crimes, que aparentemente soa como uma vontade de elucidação.

    O que acontece na PMBA hoje, no sentido de tática operacional é que estamos abandonados, sim , estamos desaparelhados. Estava lendo ontem a matéria no site do infoseg, serviço brasileiro de pesquisa a dados criminosos, onde a guarda civil metropolitana de Botucatu, que diz:

    "A guarda Civil realizou 12 prisões em 40 dias de Infoseg. "

    O que na verdade isso representa?

    Representa gestão. Segurança pública sendo aplicada por uma Guarda Civil. Excercendo papel de polícia.

    Na PMBA, nós podemos ver que as senhas de Infoseg são restritas a uma número mínimo de policiais, quando na verdade deveria estar ligada na central de radio patrulha, afimd e proporcionar maior informação ao Patrulheiro, e logo resultando em ações.

    Agora ficamos nós, levando indivíduos suspeitos sem carteira de identidade para delegacia, afim de saber quem é de fato, e após isso, somos denunciados ao Ministério Público, pelos mesmos que foram encaminhados as DPs , com alegações justas como; de exposição ao publico, constrangimento, quando tudo ´poderia ser diferente. A Polícia Rodoviaria Federal adquiriu computadores portáteis que possuem internet via banda larga e programa específico com coleor de dados e infoseg, para evitar deslocamento do veívulos até o posto na BR e ter finalidade em resultados.

    Infelizmente sei que essa matéria não vai mudar a PMBA.

    e iremos continuar numa PM desaparelhada, desustruturada e o soldado, que é o policial que trabalçha nas ruas, cada vez mais sem poder de polícia.

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